quarta-feira, 22 de março de 2017

Partidos Açorianos, um direito democrático.



Frequentemente, para compreendermos melhor certos fenómenos, temos que fazer um raciocínio básico partindo da essência das questões. 

Em democracia os cidadãos são os detentores do poder. Para que a sua vontade possa ser expressa, na maioria das democracias modernas, as populações elegem outros cidadãos para que estes os representem e tenham em consideração a sua vontade, sempre que intervenham no exercício das suas funções. Assim, o poder político é exercido indiretamente por meio de representantes eleitos, o que é chamado democracia representativa. 

Para que os cidadãos possam escolher os seus representantes formam-se partidos que apresentam programas que são sufragados. 

Os partidos são formados por pessoas que pretendem ser ativas e intervenientes e que se identificam com os princípios ideológicos que estão na essência da existência destes mesmos partidos.

Em termos muito simples este deveria ser o funcionamento do sistema onde estamos incluídos. Porém, a evolução das sociedades muitas vezes conduz-nos para cenários inesperados. 

Com o esvaziamento ideológico que se tem verificado ao nível dos partidos, estes têm vindo a tornar-se cooperações, onde impera uma lógica de conquista e exercício de poder. Como consequência o que une os seus militantes não são ideias, mas sim projetos que têm objetivos construídos por alguns dos seus membros ou por alguém que neles manda.
Para que um cidadão possa integrar as fileiras de um partido ele tem que estar em harmonia com os projetos que este apresenta e obedecer aos seus dirigentes, o que significa dizer que tem que se submeter ao existente. Por outro lado, os partidos têm vindo a transformar-se, integrando uma cultura de autoritarismo, onde as suas ações são cada vez mais determinadas pelos seus dirigentes.

Em síntese, os partidos tornaram-se associações pragmáticas, sem grandes preocupações ideológicas, que visam a conquista e o exercício do poder e onde impera um funcionamento autoritário.

Neste contexto, os partidos portugueses que têm atividade nos Açores, obedecem a uma lógica de funcionamento própria que cada vez menos reflete os anseios dos açorianos. Como consequência é notório o divorcio existente entre eleitos e eleitores o que se reflete no envolvimento das populações nos atos eleitorais, verificando-se a existência de elevados índices de abstenção.

Nos Açores os partidos deveriam refletir a vontade dos açorianos, mas em virtude de obedecerem a uma lógica própria, acabam por integrar na sua ação a defesa de aspetos exteriores à própria região e consequentemente à vontade dos habitantes destas ilhas. Desta forma as ideias dos cidadãos que deveriam ser defendidas pelos seus representantes são substituídas por ideias provenientes de atores exteriores aos Açores, impondo-se uma vontade de cima para baixo e de fora para dentro. Esta lógica contraria a essência da democracia e é perversa porque em questões estruturantes introduz elementos com os quais não concordamos nem nos identificamos, mas contra os quais não conseguimos lutar. 

Conscientes desta realidade, os europeus que vivem situações idênticas, recorrem aos partidos regionais para assim conseguirem contornar os obstáculos que as forças centralistas tentam impor. Em países como Espanha, França, Itália, Dinamarca, Reino Unido, Holanda, Bélgica, etc, etc, os partidos regionais fazem parte do sistema e têm representações em parlamentos regionais, nacionais e europeu, para além de muitos dos seus dirigentes estarem representados em vários órgãos de poder. Também se verifica que, frequentemente, são chamados a intervir na construção de soluções, nos países e nas regiões a que pertencem, comprometendo-se com dinâmicas colaborativas e não de bloqueio, como muitas vezes se pretende fazer passar a ideia. A sua importância é de tal ordem que em algumas regiões europeias são estes partidos as principais forças politicas, havendo grande simpatia dos seus concidadãos para com a sua ação.

Esta realidade não é nova para os Açorianos. A autonomia de 2 de março de 1895 só foi possível, porque um partido regional (frente eleitoral local) lutou contra a lógica dos partidos portugueses que desejavam manter os Açores na situação em que estavam e que era contrária à vontade do Povo Açoriano.

O período que antecedeu a instauração da autonomia de 1895 foi dominado, eleitoralmente pelos partidos regenerador e progressista, que alternavam o poder de acordo com as circunstâncias. Após um longo processo de luta e perante a vitória eleitoral que os regionalistas liderados por Gil Mont’Alverne de Sequeira obtiveram nas eleições de 14 de Abril de 1894, Hintze Ribeiro fez um acordo com os líder dos regionalistas, onde este se comprometeu a legislar sobre a autonomia, antes das eleições seguintes (1895) e em contrapartida os autonomistas desistiram de candidatar-se, o que permitiu ao partido regenerador de Hintze Ribeiro reconquistar o seu velho lugar, de partido mais votado.

Foi assim que um governo centralista e conservador, presidido por um açoriano, que não morria de amores pelas reivindicações autonomistas, fez publicar um decreto de inspiração claramente progressista.

Desta forma, a lógica partidária foi determinante para que fosse possível a autonomia de 2 de março de 1895, tendo sido a ação dos regionalistas determinante no rumo da História.

Integrando a nossa experiencia e a dos outros europeus, somos levados a pensar que só temos vantagens em ter Partidos Açorianos. 

Se os Açores são uma região, porque não pode haver partidos Açorianos?

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